terça-feira, 4 de setembro de 2007

Ainda sobre a ocupação na UFSC

Para quem não sabe, os estudantes que ocuparam a Reitoria durante nove dias na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) mantém um blog, de atualização diária, onde postam as moções de apoio que receberam de todo o País, a lista de reivindicações e tudo sobre a (ex-)ocupação para quem está de fora. Foi através do blog, por exemplo, que tive acesso à lista de reivindicações. Mesmo que a reintegração pacífica já tenha acontecido na última sexta-feira, gostaria de abordar mais o assunto agora que tenho tempo para escrever no blog. Eis a lista de reivindicações, motivo da ocupação:

"1. Abertura imediata de concurso público para contração de professores efetivos com Dedicação Exclusiva e servidores.
2. Aplicação imediata da regulamentação da bolsa permanência, já aprovada no CUn.
3. Aumento das bolsas para R$418,00.
4. RU noturno com administração, gerenciamento e financiamento públicos.
5. Reabertura da terceira ala do RU.
6. Renovação dos materiais do RU, com acompanhamento da comunidade.
7. Opção vegetariana no RU.
8. Ampliação da Moradia Estudantil para 10% dos estudantes matriculados na UFSC.
9. Auditoria pública com relação à Moradia Estudantil.
10. Defesa do HU 100% do SUS. Ligado ao MEC.
11. Ampliação das verbas para compras de livros da BU.
12. Fortalecimento e criação de novas bibliotecas setoriais.
13. Posicionamento contrário à entrada da PM no Campus Universitário.
14. Declaração de posição institucional contra o REUNI (decreto 6096 da Casa Civil).
15. Auditoria pública das fundações na universidade.
16. Arquivamento dos processos administrativos e criminais relacionados aos estudantes que participaram da greve de 2005.
17. Convocação de um conselho universitário aberto para a discussão de nossas reivindicações."


É importante salientar que a pauta tem, sim, pontos importantes e críticos da Universidade - não só da UFSC, mas das Universidades Públicas de todo o País; mas não que justifiquem a invasão da Reitoria - um processo unilateral e tão autoritário (ou mais) que a reintegração de posse feita pela Polícia Federal (PF). Será que realmente pontos como "7. Opção vegetariana no RU.", "13. Posicionamento contrário à entrada da PM no Campus Universitário." e "16. Arquivamento dos processos administrativos e criminais relacionados aos estudantes que participaram da greve de 2005." justicam uma ocupação antidemocrática de 100, 200 estudantes - sendo que a UFSC possui 19.045 matriculados (dados do Relatório da Gestão de 2006)?

Agora, os estudantes - que não querem ser taxados como um "Movimento do CFH" - estão ocupando o hall do Centro de Filosofia e Ciências Humanas (CFH) com autorização da diretora, a professora Maria Juracy. E continuam afirmando que, apesar de terem se retirado da Reitoria, o movimento e a luta para que as reivindicações sejam atendidas não acabou.

A conclusão que pode ser tirada de todo esse imbróglio é que o movimento estudantil responsável pela ocupação é desorganizado e sem uma estratégia política inteligente. Ao recusar a proposta feita na última terça-feira, em reunião realizada na Biblioteca Universitária (BU) pelo Reitor Lúcio Botelho - que cedeu, já que, logo após a ocupação, disse que não negociaria com os estudantes enquanto a Reitoria não fosse desocupada -, resolveram radicalizar.

Proposta do Reitor:
"1. Trazer representante do MEC para discutir a contratação de professor efetivo e a portaria que trata de contratação de professor equivalente.
2. Apoiar iniciativas que visem à contratação de professores efetivos e servidores técnico-administrativos.
3. Ratificar contratos imediatos somente para professores substitutos.
4. Ratificar revisão da matriz.
5. Licitar e iniciar as obras do novo módulo da moradia estudantil.
6. Implementar imediatamente as comissões de unidade para implementar a bolsa permanência. (atentar para a regra de transição).
7. Continuar com a posição crítica em relação ao REUNI e ampliar os espaços de discussão interna, com todos os segmentos.
8. Realizar a reforma na cozinha, para melhora da infra-estrutura do RU e gerar possibilidade de ampliação.
9. Não gerar qualquer processo administrativo com referência ao atual processo de ocupação.
10. Propor a paridade da representação estudantil na comissão para definição da política de biblioteca."


A medida seguinte do Reitor, que já estava sendo cobrado por outros setores da Universidade por ser complacente com esse tipo de movimento - é a segunda invasão ao prédio desde 2005 -, pediu a reintegração de posse na Justiça no dia seguinte. A sentença, obviamente favorável, estipulou uma multa diária de R$ 100 por dia por pessoa que estivesse ocupando a Reitoria. E o juiz que a assinou foi além, determinado a retirada de todas as barricadas do campus - atingindo também, a greve dos servidores técnicos administrativos.

Ao acatar a ação judicial de reintegração de posse, os estudantes não só perderam todas as reivindicações feitas - já que recusaram a proposta feita pelo Reitor em reunião -, como conseguiram a proeza de acabar com a greve dos servidores, que estavam paralisados há mais de 90 dias, impedindo setores estratégicos da Universidade de funcionar - como a BU, o Restaurante Universitário (RU), o Núcleo de Processamento de Dados (NPD) e o Departamento Administrativo Escolar (DAE) - desde o início desse semestre.

Em ano de eleição, nunca que o Reitor iria utilizar da força policial para expulsar os estudantes do prédio da Reitoria, e os alunos não souberam se aproveitar dessa situação política. O Reitor acabou sendo o maior beneficiário de toda a trapalhada política dos estudantes. Agora o movimento grevista perdeu toda a sua força - que já estava debilitada - sem que os professores conseguissem votar o indicativo de greve da categoria em reunião da Apufsc - Associação de Professores da UFSC. E a rotina volta ao normal, com carros e ônibus podendo entrar pela rotatória principal da UFSC, com a volta da BU e do RU para os estudantes na semana que vem e sem que servidores técnico administrativos e alunos tenham conseguido qualquer de suas reivindicações atendidas.


Crédito da foto: Lucas Sampaio/Ag. Ensaio Fotojornalismo

Um comentário:

Camila Chiodi disse...

Como essa é minha primeira vez tão perto de um movimento estudantil, ainda não sei o que penso disso tudo. Acho que concordo com o Valente que os estudantes utilizaram da forma errada pra se manifestar, mas penso que todos (nós, eu) deveriam entender melhor as pequenas (?) questões políticas, e fazer alguma coisa. Escrever sobre e discutir é um passo importante. ,)